Gostaria de homenagear a minha mãe, em nome de todas as mães.
Dra. Ana Nery - além de ser minha mãe, foi mãe de muitos, e muitos insulanos – médica, pediatra, dedicou toda a sua vida às crianças, especialmente as carentes. Foi capaz de fechar seu consultório particular para cuidar de suas filhas quando adoeceram, mas nunca deixou de trabalhar no serviço público. Muitos pacientes que atendera no Hospital Nossa Senhora do Loreto e no Posto de Saúde Necker Pinto passaram a procurá-la em casa, depois que se aposentou.
Formou duas filhas, me fez advogada, mestra em Direito, me fez professora e, hoje, me fez ser a mãe guerreira que sou – plantou em mim meu amor incondicional – meu amor de mãe. Foi e sempre será uma mãe especial. E hoje, é uma avó especial.
Sempre esteve presentes em todos os momentos da nossa vida, nos bons e nos ruins, comemorando ou nos dando seu colo, seu consolo e sua força. Em um momento especial foi ela quem esteve sempre do meu lado.
A gravidez e o parto costumam ser um momento mágico na vida de uma mulher, é o momento em que ela se torna mãe. Comigo foi um pouco diferente. Quando descobri que estava grávida foi com minha mãe que comemorei. Ela esteve presente em todas as ultra-sonografias e consultas vibrando a cada momento. No último exame uma dúvida, um pouco mais de liquido do que o normal e a indicação de que o meu bebe poderia ter problemas. No meio de tanta alegria foi um golpe que minha mãe, apesar de seus conhecimentos técnicos e, portanto, estar muito mais apreensiva do que eu, soube me dar esperanças.
No parto as dúvidas se transformaram em uma certeza: o bebe tinha problemas; e muitas outras dúvidas surgiram, pois nunca se chegou a um diagnóstico. Neste momento, foi minha mãe quem não me deixou sentir derrotada ao receber meu bebê com tantos problemas. Obviamente passei por momentos de medo, cansaço e dor, mas ela me ensinou a transformar todos esses sentimentos em armas para concluir que fui uma mulher escolhida por Deus para cuidar de um anjinho enviado por Ele.
Meu filho saiu da sala de parto direto para a UTI, sem mim. Só consegui vê-lo 36 horas depois de seu nascimento, mas nestas longas horas, ele não poderia ter tido uma mãe melhor: a minha, sua avó.
Logo na primeira semana dentro da UTI, em um hospital particular conceituado na Zona Sul, fui informada do horário de visitação e desencorajada a permanecer ao lado do meu filho como se ele já fosse um caso perdido – aquele filhote abandonado por um animal por não ter chances de sobreviver. As visitas de familiares eram vedadas e a dos avós, restritas a uma hora determinada, dois dias por semana, lhes sendo vedado uma longa permanência. As mães não eram proibidas de ficar em companhia dos filhos mas muito desencorajadas, especialmente à noite, “por estarem de resguardo”, apesar de estarem amamentando. Preferiam dar leite manipulado e mandar a mãe descansar – uma insistência demasiado estranha. Fui uma felizarda por ter uma mãe médica, que não podia ser proibida de acompanhar meu filho enquanto eu descansava, afinal, ficamos sob internação hospitalar por um ano inteiro.
Com o tempo descobri que a presença dos pais incomoda por causa da fiscalização exercida – fiscalização esta que garantiu a vida do meu bebê. Pais vêm incubadoras desligadas, bebês amordaçados com chupetas coladas por esparadrapo, crianças sendo re-entubados desnecessariamente para aprendizado de residentes, etc. Passados dois meses de internação, recebi uma ordem despejo por parte da Diretora da Equipe - também mulher e mãe - me intimou a procurar um hospital pediátrico para a transferência de meu filho pois não queria que ele morresse nas mãos de um profissional de sua equipe! Não sei o que seria de mim sem o apoio da minha mãe. Me condoía pelas outras mães que não tinham a sorte de poder contar com as suas próprias mães e dos bebês que, no final, ficavam à própria sorte. Quantas vezes, como médica a 35 anos, não foi ignorada e questionada em sua técnica quando se posicionava em relação a determinados procedimentos e lhe respondiam: “ Vovó, não é assim, você aqui é só a vovó. Sabemos o que estamos fazendo.” E nestes termos, meu filho passou um ano tomando leite quando era alérgico, pois em uma equipe a única pessoa que ventilava a hipótese de alergia era a vovó (médica, pediatra a mais de 35 anos)!
Minha mãe conseguiu juntar mais uma família que já era unida. Juntou suas duas filhas, seus respectivos maridos, minha sobrinha e meu filho sob sua proteção. Vivemos hoje orgulhosamente juntos, três famílias em uma só casa, nos alimentando de esperança, buscando um diagnóstico, lutando pelo meu filho – tudo graças a ela: A MÃE DE TODOS NÓS. Nossa trajetória foi percorrida com muito sofrimento e luta, mas sob a proteção do amor incondicional, o amor de mãe.
E foi também com ela, sob sua orientação e com a garantia de sua proteção que, nestes 6 anos de luta sem trégua, pude abandonar minha vida profissional e social pelo maior amor que existe na Terra, viceral, eterno e divino – o amor de mãe. Deixei a advocacia e o magistério para me dedicar informalmente a medicina, a enfermagem, a fisioterapia, a fonoaudiologia, a terapia ocupacional e demais carreiras das quais a vida do meu filho ainda depende – todas não remuneradas. Minha nova profissão: MÃE. Espero estar sendo para meu filho a grande mãe que ela – a avó – é para ele.
Ficamos internadas com meu filho um ano inteiro – a curta licença à maternidade acabou e chegou a licença sem vencimentos e às rescisões contratuais trabalhistas. Minha mãe e eu sabemos que:
- Mães especiais não têm salário e não têm qualquer auxílio previdenciário! Elas são obrigadas a abandonar tudo, inclusive a vida profissional para acompanhar seus filhos internados em um hospital.
- Muitas acabam abandonadas por seus maridos e têm que lutar sozinhas pela sobrevivência de seus filhos especiais.
- Muitas são criticadas pelas famílias por estarem lutando por crianças que, muitas vezes, não têm esperança e os gastos com tratamento são considerados um “investimento sem retorno”.
- Todas são obrigadas a enfrentar grandes batalhas: a busca pelo diagnóstico, a busca pelos profissionais adequados, a incansável luta contra os Planos de Saúde pelas coberturas dos tratamentos e exames necessários, a luta para conseguir remédios e alimentos especiais, muitas vezes importados e disponíveis somente com preços absurdos, vagas e reservas em hospitais, filas para marcação, remédios atrasados ou trocados - sangue trocado, profissionais despreparados para lidar com o cliente, especialmente a família adoecida e traumatizada (mesmo em hospitais particulares – top de linha).
- As poucas que lutam pelos seus direitos e pela vida de seus filhos, sofrem preconceito (“a barraqueira do quarto 501” está reclamando porque o antibiótico está com 5 horas de atraso”)
- Muitas enfrentam batalhas com médicos que se recusam a aceitar o direito do paciente a uma segunda opinião e à junta médica. A vaidade e corporativismo são camuflados pela alegação de ética profissional!
Apesar de todas as condições adversas, minha família não me abandonou. MINHA MÃE NÃO DESERTOU. Ao contrário de muitas avós modernas que vêm os netos aos finais de semana e ocasiões especiais, ela também deixou tudo pelo meu filho. Foi minha mãe que me ensinou, citando Taylor Smith: “Podemos escolher ser vítimas ou sobreviventes de nossas histórias”.
A minha mãe merece ser muito mais do que a capa do jornal, ela deve ser modelo de conduta, exemplo a ser seguido por muitas mulheres porque espelha o amor incondicional de mãe e avó - duplamente mãe - e pode representar muito bem, além de todas as mães insulanas, principalmente aquelas que receberam de Deus um filho especial. E, por experiência própria, como conheço, com riqueza de detalhes a vida árdua dessas mulheres – dedico também a elas meu carinho, meu respeito, minha solidariedade e também esta homenagem, fazendo um apelo a todos os leitores, principalmente as autoridades, para que trabalhem em prol dessas mulheres guerreiras, que abandonam tudo, menos seus filhos.
E assim concluo:
"Para Deus presentear a terra com uma criança especial, primeiro ele prepara um ventre iluminado...
Depois Ele escolhe uma mulher forte o bastante para saber lidar com esta benção...
Depois ensina o amor incondicional a esta mulher!
Por isto bendito é o ventre que gera uma criança especial e abençoada é você entre mil mulheres,
assim como um dia foi Maria a mãe da mais especial de todas as crianças que habitaram este mundo, tão pouco generoso, tão incapaz de aceitar as diferenças. Serei sempre ciente de que sou uma privilegiada por Deus e jamais penalizada...
Recebi uma criança que tem capacidade de amar mais que qualquer outra que se julga normal, e se amar sem limite é defeito, sejamos todos defeituosos de amor!!!!
Obrigada meu Deus, por ter me escolhido!"
Prece de uma mãe especial
Mais do que um filho especial eu tenho uma Mãe especial.
FELIZ DIA DAS MÃES !